TCU limita uso de prejuízo fiscal em acordos tributários e gera críticas
Decisão inédita do tribunal contraria lei expressa e é classificada por especialistas como confisco de direito patrimonial.
O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou, por meio do Acórdão TC 007.099/2024-0, limites ao uso de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) em transações tributárias. A medida, que não está prevista na legislação, foi tomada sob o argumento de proteger o erário público e gerou forte reação do setor empresarial e de especialistas em direito tributário.
A decisão ocorre no contexto da Lei 13.988/2020, que estabeleceu o Programa de Regularização Tributária (PRT) e autoriza expressamente a utilização desses créditos para quitação de débitos. O TCU, no entanto, equiparou os créditos fiscais a "descontos", submetendo-os a um limite máximo de 65%, o que, na prática, impede que empresas utilizem integralmente seus prejuízos acumulados em acordos com a Receita Federal.
Impacto direto no ambiente de negócios
O jurista e professor Ricardo Sayeg classificou a decisão como um "confisco do direito patrimonial" das empresas. "Não se trata de mera tecnicalidade, mas de verdadeiro confisco do direito patrimonial das empresas com débitos tributários", afirmou Sayeg, que é doutor em Direito Comercial e professor da PUC-SP e do Insper. Para ele, o TCU extrapolou sua competência constitucional de controle e passou a criar regras, invadindo a esfera do Poder Legislativo.
O efeito prático foi imediato. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), responsável por celebrar os acordos, manifestou discordância da decisão, mas, por "prudência administrativa", suspendeu temporariamente a celebração de novos acordos que envolvam prejuízo fiscal acima dos limites impostos pelo tribunal.
Consequências para empresas em dificuldade
O impacto é considerado especialmente grave para empresas em situação de estresse financeiro ou em processo de recuperação judicial. Para essas companhias, a possibilidade de usar créditos fiscais gerados ao longo de anos de atividade não é uma mera conveniência, mas muitas vezes uma condição essencial para a sobrevivência e a regularização de suas obrigações.
"O impacto é devastador especialmente para empresas em estresse financeiro e em recuperação judicial, para as quais o uso de créditos fiscais não é mera conveniência, mas condição de sobrevivência que a lei assim o reconhece", destacou Ricardo Sayeg em sua análise. A medida reduz a previsibilidade e o atrativo do programa de regularização, podendo desestimular a adesão e agravar a situação fiscal de milhares de empresas.
Questionamento legal e próximos passos
A decisão do TCU é passível de questionamento judicial, pois confronta diretamente o texto da Lei 13.988/2020. Especialistas apontam que a interpretação do tribunal desconsidera a natureza jurídica dos créditos tributários decorrentes de prejuízo fiscal, que são considerados direitos patrimoniais das empresas, garantidos constitucionalmente pelo direito de propriedade privada.
Enquanto a PGFN mantém a suspensão cautelar, a expectativa do mercado é por uma solução jurídica que reestabeleça a segurança jurídica. A controvérsia coloca em evidência a tensão entre a atuação dos órgãos de controle e a autonomia do legislativo na criação de políticas fiscais, com potencial para gerar novas ações no Supremo Tribunal Federal (STF).
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