PCC usou oito integrantes em operação sofisticada para executar ex-delegado em SP
Investigação revela estrutura hierárquica e divisão de funções em atentado que matou Ruy Ferraz Fontes em setembro de 2025.
A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes, em 15 de setembro de 2025 na Praia Grande (SP), foi resultado de uma operação planejada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) que envolveu pelo menos oito integrantes com funções específicas, de acordo com investigações da Polícia Civil e do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo. O crime, considerado uma retaliação por ações de Fontes contra a facção nos anos 2000, expôs um protocolo operacional sofisticado destinado a proteger os mandantes.
A célula criminosa foi estruturada com uma clara divisão de tarefas: recrutamento e comando, execução direta, logística de veículos e armas, e fornecimento de infraestrutura. A maioria dos envolvidos tem passagens por crimes como tráfico de drogas, roubo e porte ilegal de arma, mas a operação também contou com indivíduos sem antecedentes criminais para atuar abaixo do radar policial.
Comando e recrutamento couberam a "Fiel"
No topo da hierarquia operacional estava Marcos Augusto Rodrigues Cardoso, 36, conhecido como Pan, Fiel ou Penélope Charmosa. Identificado como "Disciplina" do PCC na região do Grajaú, zona sul de São Paulo, ele foi preso em 3 de novembro de 2025. A acusação o aponta como o recrutador e gestor da célula, responsável por escalar Umberto Alberto Gomes, o Playboy, para a missão. Provas telemáticas mostram que, seis dias após o crime, Playboy agradeceu a Fiel pela "oportunidade" de ter sido escolhido. Em interrogatório, Fiel admitiu integrar e exercer função de liderança no PCC.
Execução direta e limpeza de rastros
A linha de frente do atentado teve Luiz Antonio Rodrigues de Miranda, 43, o Gão ou Vini, como uma das peças centrais. Foragido, ele é acusado de ser atirador e operador tático. Câmeras de segurança o flagraram no dia do crime caminhando em Praia Grande carregando um fuzil enrolado em um cobertor cor-de-rosa. Ele também adquiriu as balaclavas usadas pelo grupo. Após a execução, escondeu o arsenal na casa de um comparsa e coordenou sua recuperação no dia seguinte.
Flávio Henrique Ferreira de Souza, 24, o Beicinho ou Neno, também foragido, atuou na logística e na execução. Suas impressões digitais foram encontradas no Jeep Renegade usado na fuga. Ele recebeu as chaves de um imóvel em Mongaguá usado para esconder o veículo e integrou o comboio de ataque.
Rede de apoio logístico e infraestrutura
A operação dependeu de uma rede de apoio que forneceu veículos, armas e esconderijos. Felipe Avelino da Silva, 33, o Mascherano, preso em 7 de novembro de 2025, confessou ter furtado o Jeep Renegade e instalado placas falsas. Sua mulher relatou à polícia que ele deixou o veículo em local específico para a fuga.
Paulo Henrique Caetano de Sales, 38, o 13 ou PH, motorista do SAMU e sem antecedentes, cedeu seu imóvel em Praia Grande que serviu de quartel-general. A perícia encontrou impressões digitais de Playboy no local. Após o crime, fugiu para um sítio.
Cristiano Alves da Silva, 36, o Cris Brown, preso preventivamente, cedeu uma casa em Mongaguá onde o Jeep Renegade ficou escondido por 45 dias antes do crime. A quebra de sigilo telefônico revelou intensa comunicação com Playboy.
Willian Silva Marques, 36, também preso, sem antecedentes, forneceu uma casa em Praia Grande. Ele desligou remotamente as câmeras de segurança do local antes da operação. O imóvel foi usado para armazenar o fuzil após o crime.
Resgate do arsenal e vítimas colaterais
No dia seguinte ao atentado, Dahesly Oliveira Pires, 26, foi acionada para recuperar o arsenal. Por chamada de vídeo com Gão, ela localizou o fuzil no cobertor rosa e outros itens na casa de Willian, transportando-os para São Paulo. Ela recebeu R$ 1.500,00 e o perdão de uma dívida de R$ 5.000,00. Foi denunciada por porte ilegal de arma e favorecimento pessoal.
O ataque resultou em vítimas colaterais. Gustavo Henrique Gonçalves, 20, e sua tia Samantha Gonçalves Carvalho, 33, foram baleados na perna durante uma festa de comemoração pela soltura de Gustavo, que ocorria na rota de fuga dos criminosos. Ambos sobreviveram após serem levados ao hospital por um familiar.
Próximos passos das investigações
Os oito integrantes identificados foram denunciados pelo Ministério Público por integração em organização criminosa armada e homicídios qualificados. As penas podem chegar a 30 anos de prisão. Dois dos principais acusados, Gão e Neno, continuam foragidos. As investigações seguem para identificar possíveis mandantes de escalão superior dentro do PCC e desvendar a rede de financiamento da operação. A Polícia Civil trabalha com a hipótese de que a ordem para eliminar Fontes partiu da cúpula da facção como represália por sua atuação contra a organização no passado.
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